"Quando os jovens de uma nação são conservadores, o sino de seu funeral já tocou" Henry Ward Beecher

"Quando os jovens de uma nação são conservadores, o sino de seu funeral já tocou"
Henry Ward Beecher

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A locomotiva por cima da vida dos trabalhadores

O agricultor Antonio Nunes, de 78 anos, não esconde a tristeza. Morador da comunidade de Serragem, no município baiano de Caetité, ele tem dificuldades em chegar à plantação que fica atrás de sua casa. O motivo é sua mais nova vizinha, a Ferrovia de Integração Oeste- Leste (Fiol), carro-chefe do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na Bahia. 
As obras da ferrovia passam dentro de sua propriedade atrás da residência do agricultor, colocando-se entre a casa e a lavoura. Sua esperança é de que a empresa responsável pelo projeto, a estatal Valec – Engenharia, Construções e Ferrovias S.A. – cumpra o prometido e abra uma passagem para facilitar o acesso à lavoura. Hoje, sem o caminho, ele é obrigado a passar pelo fosso aberto pela construção.  
Antonio perdeu oito hectares (equivalente a oito campos de futebol) e recebeu três mil reais de indenização. “A gente não tem muita experiência para saber o quanto vale, eu achei pouco. Deu só pra comprar umas coisinhas e mais nada”, conta.   
A tranqüilidade de antes, no povoado, também não existe mais. A todo momento, relata Antonio, há funcionários das obras nos arredores de sua casa. Além disso, o barulho e a poeira incomodam. “Quando tem sol quente é muita poeira. E o barulho é o dia todo. Tem horas em que a gente até acostuma”, diz.   
Fiol
Com 1.527 km de extensão e orçada em R$ 7,43 bilhões, a Ferrovia de Integração Oeste-Leste ligará o município de Figueirópolis, no Tocantins, a Ilhéus, cruzando 32 municípios baianos. Em Ilhéus a Fiol deverá encontrar o Complexo Intermodal Porto Sul, que ainda aguarda licença ambiental prévia (leia matéria aqui).         
Dividida em sete lotes, a Fiol possui licença de instalação para os quatro primeiros, entre Ilhéus e Caetité. No quinto, entre Caetité e Barreiras, a obra aguarda concessão da Licença de Instalação por parte do Ibama. Já o trecho entre Barreiras (BA) e Figueirópolis (TO) ainda não tem definição de prazo de licença e início das obras.       
Fonte: Valec
O argumento do governo Jaques Wagner (PT) para a construção dos empreendimentos é alavancar a economia baiana, especialmente do litoral sul do estado, em estagnação há mais de 20 anos desde a crise do cacau na região.     
Pela ferrovia deverão ser transportados soja, farelo de soja e milho, fertilizantes, combustíveis e minério de ferro, especialmente da Bahia Mineração (Bamin). A empresa, que pertence à mineradora Eurasian Natural Resources Corporation (ENRC), do Cazaquistão, já comprou 25% da capacidade de transporte da ferrovia, que levará minério do Projeto Pedra de Ferro, em Caetité, até o Porto Sul, junto ao qual a Bahia Mineração pretende construir um Terminal de Uso Privativo (TUP) para escoar sua produção.    
Impactos
Em vez de vantagens, porém, para as comunidades cortadas pela estrada de ferro o que sobra são impactos ambientais e sociais. Segundo um levantamento preliminar da Comissão Pastoral da Terra (CPT) na Bahia, 1.629 famílias de comunidades quilombolas e de agricultores serão afetadas pelas obras da Ferrovia Oeste-Leste no estado.          
Em Tocadas, no município de Brumado, as obras da Fiol ainda não começaram, mas os transtornos, sim. Pelo projeto, a ferrovia passará exatamente nomeio do povoado. Das cerca de 60 famílias que ali habitam, 14 terão suas casas destruídas, e muitas outras perderão as plantações. Nem a igreja da comunidade escapará.        
O casal Angelino Souza Pinto e Teresinha Rosa da Silva Pinto,
moradores de Tocadas, no município de Brumado
O casal Angelino Souza Pinto, 68 anos, e Teresinha Rosa da Silva Pinto, 72 anos, só soube da ferrovia quando se deparou com funcionários fazendo medições em frente à sua casa. “Chegaram sem a gente ver. Quando vimos estavam ali com as estacas. E ainda disseram que se a gente arrancasse ia ser crime”, indigna- se Angelino.         
Os agricultores, que perderão três hectares, reclamam que a ferrovia passará sobre as melhores terras da região, que ficam ao lado do rio. “Nós temos outros lugares, mas é pedra, não dá pra plantar”, diz Teresinha, lembrando ainda que, com o ruído dos trens, a criação de animais também ficará prejudicada. A ferrovia ficará a 35 metros da residência do casal, que já antevê os problemas em morar tão perto de uma estrada de ferro. “Não vai ficar nada em pé. Nossas casas são antigas, têm mais de cem anos. Aqui é tão sossegado, aí vem um inferno desses e acaba com a tranquilidade”, lamenta Angelino.    
Valec
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da Valec informou, por meio de nota, que “o traçado da ferrovia foi concebido de modo a minimizar os impactos sociais do empreendimento”. O texto diz que ainda que haja três mil desapropriações entre os trechos de Ilhéus e Barreiras, “todas as benfeitorias, culturas e terras impactadas serão indenizadas, permitindo que as famílias possam adquirir novas propriedades”.     
Os valores das indenizações, segundo a estatal, “seguem tabelas de referência feitas por profissionais especializados e levam em consideração as peculiaridades de cada região, variando de acordo com suas características”. A Valec, no entanto, não se pronunciou sobre o número de famílias que serão atingidas pelo empreendimento.    
Tem gente morando aqui
O agente da CPT na Bahia Gilmar Ferreira dos Santos, porém, refuta os argumentos de que os impactos tentaram ser minimizados. Para ele, o projeto não levou em consideração a dinâmica das comunidades por onde passaria a estrada de ferro.  
“Eles alegam uma série de situações de cavernas, nascentes, mas em momento nenhum citaram o impacto que isso vai ter sobre a vida das pessoas. É como se a ferrovia estivesse passando por um lugar morto, que não tivesse gente”, opina.  
Outra característica da ferrovia, segundo Gilmar, é que ela corta as áreas mais produtivas dentro dos povoados, próximas aos rios, prejudicando a sobrevivência das comunidades. “Imagine, são 80 metros de largura [a ferrovia]. As propriedades das famílias têm 50, 40 ou até 100 metros de largura. Isso inviabiliza a vida dessa população”, afirma. As consequências negativas para os agricultores evidenciam, para o agente da CPT, que os pequenos produtores estão fora das supostas melhorias econômicas propiciadas pela ferrovia. “Eles [agricultores] simplesmente vão ver uma ferrovia passar dentro das suas propriedades, carregando grãos da produção do agronegócio do Oeste da Bahia e todo o minério que está nesse percurso da região sudoeste”, explica.  
Lista de prejuízos
É justamente o impacto na produção agrícola o que mais preocupa o agricultor Hugo Marques de Assunção, 49 anos, que vive na comunidade do Vapor, no município de Ubaitaba. Metade de sua terra produtiva será desapropriada para a passagem da ferrovia pelo povoado. Dessa terra dependem, além de Hugo, seus oito irmãos e sua mãe de 86 anos.  
Hugo Marques de Assunção, que vive na comunidade do Vapor, em
Ubaitaba, contabiliza os prejuízos que terá com a estrada de ferro
A indenização ofertada não agradou o agricultor. Segundo ele, a Valec ofereceu 31 mil reais para seus três hectares que serão atingidos, além de mil reais pela prensa [aparelho para fabricação de farinha de mandioca]. Só para construir outra prensa, explica Hugo, são necessários de 3 a 4 mil reais.        
Ele também já listou no papel o que perderá com a ferrovia - serão vários pés de dendê, acerola, tangerina, cacau, além de uma roça de jasmins. Por essa produção, no entanto, não deverá receber qualquer ressarcimento.       
“[Eles] vêm pra cá obrigando a gente a vender e o preço tem que ser deles. Não sou contra a ferrovia passar, mas que façam tudo direitinho”, explica. Além de indisposição dos empreendedores para dialogar, Hugo reclama de falta de critérios para o pagamento das indenizações. Ele garante que outro proprietário da região, dono de uma grande propriedade rural, foi indenizado em 100 mil reais só por uma prensa. Diante da injustiça, o trabalhador promete resistir em sua terra. “Podem ir fincando as estacas [de marcação] que eu vou atrás arrancando”, adianta.   
Família inteira
Já para Evanisa Macedo de Farias, 30 anos, a ferrovia significará a perda de sua casa que ainda está em construção em Aldeia, no município de Santa Maria da Vitória. Iniciada em 2007, as obras da casa estão paradas desde 2009, quando surgiu a notícia da estrada de ferro no local. Hoje, Evanisa vive com o marido e dois filhos na casa de sua sogra, sem saber se, um dia, poderá terminar sua própria. 
Para Evanisa Macedo (com a criança no colo),
ferrovia significará a perda de sua casa
A agricultora reclama de falta de informações sobre o projeto. Ela conta que, um dia, foi surpreendida por técnicos da obra no terreno da família, antes de receber qualquer notificação oficial ou de autorizar as medições. “Eles [técnicos] estavam entrando [nos terrenos] sem explicação. Na terceira ou quarta vez dissemos a eles que não podiam entrar aqui. Aí disseram que era obra do governo federal e que podiam entrar de qualquer jeito”, relata.        
Ela, porém, não será a única prejudicada na família. Seu pai e seu irmão também perderão as propriedades. Gerônimo Macedo de Farias, de 71 anos, se mostra preocupado com o avanço da ferrovia. “A gente não está nada animado com isso aí porque a estrada a gente tem, estão fazendo isso para eles. Vamos perder muita coisa. É coisa de gente pobre, mas que demora pra construir”, diz. Gerônimo denuncia ainda que a ferrovia atingirá uma área de reserva legal que ele cultiva há 30 anos. Uma das estacas de marcação, inclusive, está localizada já dentro da mata.       
Segundo ele, até hoje, nenhum responsável pelo empreendimento foi à sua casa para explicar como serão as indenizações.“Só quem trabalha na obra é que conversa com a gente. Só disseram que alguém um dia iria chamar a comunidade [pra conversar]”, explica.
Abaixo-assinado
Já na comunidade Coragina, também no município de Santa Maria da Vitória, os moradores conseguiram, por meio de um abaixo-assinado, mudar o traçado da obra, deslocando a ferrovia 300 metros para longe do rio. Depois de coletadas as assinaturas, o documento foi enviado à Promotoria do município e, em seguida, para o Ministério Público Federal (MPF) em Brasília.    
Pelo projeto original, a casa de Raimunda Maria Ferreira, 56 anos, teria que ser demolida para a construção da ferrovia. “Perto de 60 anos, fazer outra, seria o fim”, conta. Com o abaixo-assinado, porém, sua residência não será mais atingida.    
A luta, no entanto, não deve parar na comunidade, já que a ferrovia inviabilizará o acesso das famílias a muitas lavouras e locais de criação de animais. Segundo Raimunda, a Valec se comprometeu a construir corredores para os agricultores atravessarem a ferrovia, mas nem a promessa a anima. “A gente tem a vida arrumadinha e agora vou ter que achar esse passador. Se isso [ferrovia] aí sair, ainda vai incomodar”, diz. 

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Sem acordo com empresas, aeroviários mantêm ameaça de greve

A reunião de conciliação do TST (Tribunal Superior do Trabalho) desta segunda-feira com representantes das empresas aéreas e funcionários terminou sem acordo.
Assim, os aeroviários e aeronautas mantêm a ameaça de iniciar uma greve a partir das 23h de 22 de dezembro, informou a assessoria de imprensa do TST.
Juca Varella/Folhapress
Aeroviários durante protesto no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, na semana passada
Aeroviários durante protesto no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, na semana passada
Os sindicatos se comprometeram a manter 20% da categoria trabalhando durante a greve, segundo o twitter oficial do TST. Ainda segundo o tribunal, os funcionários das aéreas reivindicam reajuste de 10%.
A ministra do TST Dora Maria da Costa foi eleita relatora do dissídio dos aeroviários e aeronautas.
Os trabalhadores pedem reajustes de até 14%, mas as empresas oferecem apenas 3%. O impasse se arrasta a semanas e rachou o movimento sindical. Os sindicatos ligados à CUT e aqueles ligados à Força Sindical não sentam na mesma mesa para negociar com o Snea, o sindicato das empresas aéreas.
A CUT se dizia mais propensa a entrar em greve, enquanto os sindicatos ligados à Força Sindical apelaram ao Ministério Público do Trabalho com um pedido de conciliação.
Com a entrada do processo no TST, a Justiça é quem vai decidir os valor do reajuste salarial das categorias. Como não houve consenso no tribunal, a decisão deve ir a julgamento.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Victoria’s Secrets é acusada de usar algodão que exploram trabalho infantil e escravo de Burkina Faso, na África

Trabalho infantil e escravo foi explorado em fazendas de algodão orgânico em Burkina Faso, na África, que fornecem para produtos da grife britânica de lingeries Victoria's Secrets. A informação consta em um relatório de 2008 sobre fazendas certificadas com selos de comércio justo no país e confirmada por reportagem da agência norte-americana Bloomberg News, publicada nesta sexta-feira.
O estudo de 2008 da Helvetas Swiss Intercooperation, organização sediada em Zurique, sugere que "centenas, senão milhares" de crianças poderiam estar vulneráveis a exploração em fazendas no país, na produção de algodão empregado em cadeias produtivas de marcas importantes. O produto era beneficiado e transformado em roupas em fábricas no Sri Lanka e na Índia.
A jornalista Cam Simpson passou seis semanas no país e encontrou casos como o de uma menina de 13 anos que trabalha junto da mãe em uma propriedade na colheita do algodão. Segundo a reportagem, é o segundo ano em que a adolescente trabalha no local.
A marca Victoria's Secret usa como marketing a informação de que a maior parte do algodão provém de fazendas com certificação de produção orgânica ou de comércio justo. Parte das roupas íntimas da grife traz o percentual mínimo de "fibras orgânicas" que compõe a peça vendida.
A empresa nega ter conhecimento do relatório de 2008. A federação de fazendeiros de Burkina Faso, parceira comercial responsável por promover os princípios orgânicos e de comércio justo, também rechaça a hipótese de serem empregadas crianças nas colheitas.
Segundo a reportagem da Bloomberg, o caso mostra fragilidades de certificações de comércio justo. O segmento teve crescimento de 27% em 2010, alcançando US$ 5,8 bilhões. Parte do avanço decorre justamente da promessa das marcas de que não há exploração de trabalhadores em condições sub-humanas.
Neste ano, no Brasil, a marca espanhola Zara, da empresa Inditex, foi acusada de explorar trabalho escravo no interior de São Paulo. Imigrantes bolivianos estavam entre as pessoas libertadas por fiscais do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego. A companhia ainda negocia um termo de ajuste de conduta (TAC) com os promotores que acompanham o caso e viu sua imagem ser desgastada pelo amplo alcance internacional da notícia.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Estudantes promovem ato em solidariedade ao povo Guarani Kaiowá

Estudantes da PUC São Paulo, juntamente com organizações sociais, promoverão no próximo domingo, às 14h, uma passeata em solidariedade ao povo Guarani Kaiowá e contra genocídio promovido pelo avanço do agronegócio no estado do Mato Grosso do Sul.
O protesto contará com lideranças representantes do movimento Aty Guasu do povo Guarani Kaiowá e terá concentração na  Av. Paulista, Praça Oswaldo Cruz -- entre as Ruas Bernardino de Campos e a Rua Desembargador Eliseo Guilherme.
De acordo com o Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Mato Grosso do Sul tem o segundo maior número absoluto de habitantes indígenas do país, são 79,2 mil, o que representa 9% da população indígena do país. Entretanto, segundo com o último relatório do Cimi, o estado concentrou 55% dos casos de mortes de indígenas no país nos últimos oito anos. Nos primeiros nove meses de 2011, 27 indígenas foram assassinados no MS, 71% dos 38 assassinatos ocorridos no país.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

E a Europa se foi. Para onde mesmo?

A maneira mais simples – e também a mais simplória – de interpretar o que aconteceu na última cúpula da União Européia, na semana passada, em Bruxelas, é dizer: “a Inglaterra está isolada”.

Não está. Em primeiro lugar, os Estados Unidos não vão deixar sua parceria preferencial (antiga metrópole) abandonada. Em segundo lugar, a opção do governo conservador de David Cameron é perfeitamente compreensível: jamais ele iria colocar sob a supervisão de Bruxelas (quer dizer, de Berlim e da França) a City londrina, seu centro financeiro. Um “Occupy Londres” dessa natureza é impensável. Em terceiro lugar, a situação da Europa continental é tão complicada quanto a britânica. 

A imposição das balizas germânicas para gerir a crise provocou inúmeras frinchas e rachaduras – inclusive dentro da própria Alemanha. Hungria, Suécia e República Tcheca aderiram, mas condicionalmente a consultas a seus parlamentos. Os outros países também estarão sujeitos a consultas semelhantes. Até a Alemanha, cuja Suprema Corte determinou que qualquer acordo internacional dessa natureza deve ser submetido ao Bundestag.

A Dinamarca e outros países da U. E., mas não da Zona do Euro, se submeteram, mas “rezingando”, como se diz no pampa. Mesmo nessa Zona as “adesões” não se deram sem “refugos”, para dizer o mínimo. Na própria França, este é o caso. A França (quer dizer, o governo de Sarkozy) nunca escondeu que prefere um “clube seleto” para decidir as políticas da moeda euro a essa colcha de retalhos em que a Zona do Euro acabou se transformando. Porém também não quer ver seu sistema bancário escrutinado por Bruxelas – ou seja – Berlim.

A hegemonia conservadora que rege o Consenso (ou a Corte) de Bruxelas não gosta de ser lembrada que deve olhar para os povos cujos destinos dirige: prefere dirigi-los sem vê-los. Mas desta feita uma coisa está cada vez mais evidente: o modo autocrático de gerir a crise gerou Europa afora mais ressentimentos do que reconhecimento. Um novo movimento semelhante ao de 1848, que momentaneamente implodiu a Europa da Santa Aliança restauradora, pode estar em preparo. Mas como naquela ocasião, quem pode acabar “levando” esse descontentamento é a direita, não a esquerda. Como, aliás, naquela ocasião, o próprio Marx previu.

Na Alemanha, as pesquisas de opinião revelam uma divisão: a última, feita pelo jornal sensacionalista Bild, mostra que metade do eleitorado acha que o país estaria melhor sem a U. E., e que metade acha que não. O resultado (pelo menos na versão em que li) é impreciso, porque esse “eleitorado” é tratado “em bloco”: não se sabe que grupos apóiam o que, que faixa etária, classes sociais, regiões, etc. Mas de qualquer modo, é um sintoma das perplexidades cotidianas em que se navega por aqui.

O mais difícil de enfrentar, porém, é a falta de perspectivas, de alternativas. Há um consenso plúmbeo de que as coisas como estão são inevitáveis. Romper com a filosofia da austeridade? Impensável. Fazer o Banco Central Europeu comprar a dívida italiana ou a espanhola, ou outras menores, como a portuguesa ou a irlandesa? Impensável, porque isso seria “dar dinheiro para os indisciplinados”. A grega, então, nem se fala. Já basta o setor privado ter arcado com parte do prejuízo provocado por aqueles “irresponsáveis”.

Nos países em estado crítico, por sua vez, predomina um ressentimento cru antialemão. Na Grécia, muitos manifestantes carregam cartazes com efígies da chanceler Ângela Merkel envolta em suásticas, ou então com um capacete do exército alemão da 1a. Guerra Mundial. Em termos de Europa, essas coisas nada têm de engraçadas. Além de um equívoco político de grandes proporções (e aqui não vai nenhuma apologia da política conservadora do governo alemão), manifestações como essa são sintoma de um desarrazoado ressentimento que acaba jogando água no moinho das direitas. Isso mostra que por debaixo dos acordos de cúpula grassa uma carência de propostas positivas para fazer os países enfrentarem a crise com criatividade.

O novo acordo de Bruxelas fez apenas jogar as opções decisivas para diante. Em março haverá uma reavaliação das cifras necessárias para o fundo de estabilização da moeda. O que isso quer dizer? Que em março Sarkozy e outros governantes vão continuar pressionando para que o Banco Central Europeu emita letras resgatáveis e intervenha no mercado comprando títulos das dívidas italiana e espanhola. E que o BCE vai continuar resistindo, a menos que a chanceler Merkel autorize o movimento. Até lá a renovação das letras vincendas de Espanha e Itália – as de longo prazo – continuará altíssima, porque continuará a existência de dúvidas quanto à capacidade de serem honradas pelos devedores. E assim por diante.

Só haverá um fim para essa novela: ela está contida numa simples frase, mas essa sim, nada simplória.

"Só a volta a uma política de crescimento pode resolver os problemas da dívida dos países europeus e dos Estados Unidos". 

Quem disse isso? Paul Krugman? Joseph Steglitz? Ricardo Carneiro? Saul Leblon? Lá no fim da lista, Flávio Aguiar? Não, embora todos eles (nós) pudéssemos ter dito.

Foi a companheira Christine Lagarde, diretora-presidenta do FMI, em visita ao Brasil, vejam só.

O tempora o mores. 

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

McDonald’s é multado em R$ 3 milhões por propaganda abusiva ao público infantil

O McDonald’s foi multado em R$ 3,192 milhões pela Fundação Procon de São Paulo por  prática de propaganda abusiva. A rede de lanchonetes fast food foi penalizada por praticar a venda de alimentos casada a de brinquedos, voltada ao público infantil, em seu produto McLanche Feliz. A denúncia foi feita em 2010 pela ONG Instituto Alana, no Projeto Criança e Consumo.
Segundo o Instituto, vender alimentos associados a brinquedos “cria uma lógica de consumo prejudicial e incentiva a formação de valores distorcidos, bem como a formação de hábitos alimentares prejudiciais à saúde”.
O McLanche Feliz é um conjunto que inclui um lanche e um brinde com personagens de desenhos e filmes infantis. O Procon afirma que desde a data da denúncia, mais de 18 campanhas deste tipo foram realizadas pelo McDonald’s. O preço praticado atualmente é R$ 13 o kit.
A rede de fast food declarou, em nota à imprensa, que não se pronuncia sobre processos em andamento, mas que cumpre “rigoroso código de auto-regulamentação publicitária”. A empresa ainda pode recorrer da decisão.
A venda desse tipo de produto já foi proibida em cidades dos Estados Unidos, como São Francisco e Santa Clara, no estado da Califórnia.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Petroleiros entram em greve e ameaçam parar produção

“Quem descobriu o pré-sal merece mais! Principalmente mais respeito dignidade, salário justo e condições dignas de trabalho.”
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Os petroleiros começaram nessa quarta (16) a greve nacional de uma das categorias com maior história de luta. Em outras oportunidade, os trabalhadores da Petrobrás realizaram uma greve de 32 dias em 1995 com todo tipo de repressão do Governo FHC, além de manifestações massivas até as redes  Globo e Manchete, conseguindo, inclusive direito de resposta em TV aberta. A pauta de reivindicações atual é extensa, mas uma das principais bandeiras é por aumento real no salário. A Petrobrás, mesmo com todos os recordes, não garante há anos ganho real para os seus trabalhadores que com suor e inteligência descobriram o pré-sal.
Plenária realizada no último sábado (12), reuniu representantes do Sindipetro-RJ, da Frente Nacional dos Petroleiros (FNP) e seus sindicatos filiados, a Fenaspe e as oposições de Caxias e Norte Fluminense. Na avaliação dos resultados das assembleias, ficou claro que a nova proposta está distante das reivindicações da categoria, que já rejeitou amplamente a proposta anterior, muito semelhante a esta. O movimento decidiu manter o Estado de Greve, a assembleia permanente, e também a Greve Nacional Unificada da Categoria, com parada de produção e por tempo indeterminado.
Na avaliação da Federação Única dos Petroleiros (FUP), a contraproposta da Petrobrás não garante o direito à vida, nem mecanismos de gestão que rompam com os acidentes que matam e mutilam trabalhadores. O Sindipetro-RJ vem trabalhando com a seguinte palavra de ordem: “Quem descobriu o pré-sal merece mais! Principalmente mais respeito dignidade, salário justo e condições dignas de trabalho.”

Trabalhadores do setor aéreo entram em estado de greve

Os trabalhadores do setor aéreo se preparam para entrar em greve.
Os Trabalhadores em Aviação Civil irão se reunir em assembleia no dia 12 para debater como será a greve, que pode começar a partir do dia 13.
A categoria reivindica a reajuste no piso salaria 10% e de 13% nas demais faixas. De acordo com a Fentac (Federação Nacional dos Trabalhadores em Aviação Civil), a categoria está unificada e a greve deve atingir todas as atividades da aviação civil.
A categoria esta submetida há um enorme arrocho salarial, como também a um enorme excesso de serviço, extensas jornadas de trabalho que vem originando assédio moral da chefia e doenças ocupacionais.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

István Mészáros: as contradições dos nossos tempos

Era uma manhã fria de junho quando o filósofo húngaro István Mészáros, 81 anos, apareceu à porta da casa no bairro de Sumarezinho, zona oeste de São Paulo, onde se hospeda quando vem ao Brasil. Desta vez, a viagem tinha como escala, além da capital paulista, as cidades de Salvador, Fortaleza e Rio de Janeiro. A ideia era participar de encontros e divulgar o livro István Mészáros e os Desafios do Tempo Histórico (Boitempo, 280 pág., R$ 43), uma coletânea de artigos sobre sua obra – inclusive com um artigo de sua autoria.

Alto, os olhos enormes e azuis, Mészáros não parece, à primeira vista, a metralhadora giratória que se apresenta logo no início da entrevista, quando faz um relato de quase 40 minutos sobre a situação políticas na Europa e nos EUA. “Berlusconi é um palhaço criminoso”; “Obama diz que vê a luz no fim do túnel, mas não vê que é a luz de um trem que vem em nossa direção”; “A Alemanha se engana quando pensa que vive um milagre econômico”; “O partido socialista agiu contra os trabalhadores na Espanha”; “Os políticos na Inglaterra parecem uma avestruz que insistem em esconder sua cabeça debaixo da terra”…
Em cada resposta, o professor emérito de Filosofia da Universidade de Sussex e um dos mais destacados marxistas da atualidade deixa sempre explícita a necessidade de se entender o processo histórico da formação da sociedade atual para que se possa compreender, de fato, qualquer questão dos nossos tempos. Crítico da social-democracia europeia, que ao longo do século assumiu um tom reformista dentro do sistema dominante, Mészáros, que foi discípulo de György Lukács (autor de História e Consciência de Classe Ontologia do Ser Social), vê com desencanto as opções que hoje se apresentam à esquerda, e também as manifestações populares que estouraram pelo mundo desde o início do ano. O motivo é simples: o discurso funciona, mas a realidade é que o sistema capitalista é cada vez mais inviável, com líderes das nações buscando mais dívidas para cobrir rombos colossais e a necessidade de se produzir cada vez mais num momento de esgotamento de recursos. A chamada crise financeira internacional, portanto, não é cíclica, mas estrutural, conforme pontua.
Mesmo assim, em duas horas e meia de entrevista, Mészáros deixa escapar um certo tom de otimismo em relação ao futuro – “que, infelizmente, não será no meu tempo” – quando fala sobre tomadas de consciência e mudanças que observa na América Latina.
Entrevista concedida a Matheus Pichonelli e Ricardo Carvalho
As contradições do capitalismo
E assim as questões imediatas serão priorizadas em detrimento dos reais problemas que assolam a sociedade americana, que nunca serão confrontados. Então por um lado temos a perspectiva de tempo de 50 anos e, por outro, uma trágica realidade de pressões em termos de três, quatro, cinco anos”
As contradições terão de ser enfrentadas por esses movimentos que emergiram no mundo árabe e na Europa. Terá de ser um movimento das massas, sem pequenos grupos de intelectuais se reunindo e tomando as decisões. E sim as massas, que devem estar dispostas a assumir o fardo e as consequencias de realmente fazer alguma coisa. E, ao mesmo tempo, elas devem aceitar as responsabilidades das escolhas que forem feitas. Isso é importante porque, no nosso círculo de decisões políticas existente hoje, ninguém nunca é responsável. Eu lembro que nos Estados Unidos houve uma investigação sobre o “Iran–Contra Affair”, a cumplicidade de algumas figuras políticas do alto escalão norte-americano com o regime iraniano. Isso foi durante o governo de Ronald Reagan.
O Congresso chegou a produzir uma resolução em que afirmava que Reagan havia subvertido a Constituição dos Estados Unidos. Ele subverteu a Constituição do seu país e deveria assumir total responsabilidade por isso! Mas o que aconteceu? A resolução tornou-se um punhado de palavras vazias e Reagan quase foi beatificado como um dos grandes estadistas dos Estados Unidos. Isso representa a total subversão dos nossos valores. Porque até mesmo valores sérios do pensamento liberal, como os defendidos por John Stuart Mill no século XIX, que confrontou de maneira inadequada, mas confrontou, a contradição do crescimento ininterrupto da nossa economia, está fora de questão. Ninguém nunca é responsável.
O que acontece nas eleições? Um novo partido continuará a culpar seu antecessor exaustivamente. Isso acontece hoje na Grã Bretanha, onde existe uma coalizão entre o partido conservador e o partido liberal. E eles não fazem mais do que afirmar que tudo o que produzem de negativo é consequência da administração anterior, do Partido Trabalhista. Isso é característico de um avestruz que insiste em esconder sua cabeça debaixo da terra.
Existe uma outra característica que precisamos observar, a dimensão de tempo. É completamente absurdo o discurso dos políticos quando afirmam que em 2050 os níveis de carbono estarão reduzidos e nossos problemas ambientais resolvidos. Nós estamos caminhando exatamente na direção contrária. Então por um lado temos uma projeção de tempo que engloba os próximos 30, 40 e 50 anos enquanto nossa cultura defende que encontremos soluções para os próximos quatro ou cinco anos, porque um ciclo político não vai muito além desse tempo. Nos Estados Unidos teremos eleições em breve, quando Obama provavelmente será reeleito. E assim as questões imediatas serão priorizadas em detrimento dos reais problemas que assolam a sociedade americana, que nunca serão confrontados. Então por um lado temos a perspectiva de tempo de 50 anos e, por outro, uma trágica realidade de pressões em termos de três, quatro, cinco anos.
O sistema capitalista não só foi válido por um tempo considerável como foi, de longe, mais poderoso e dinâmico do que qualquer outro sistema. Mas existe um limite para isso e esse sistema está se tornando cada vez mais destrutivo. E esse é o grande problema que os movimentos políticos e sociais terão de enfrentar, a separação da política das dimensões sociais e econômicas. Isso é parte do capitalismo, agrupar essas três dimensões. Se, no passado, o agrupamento dessas dimensões funcionou e possibilitou transformações econômicas violentas, além de transformações políticas, hoje já não surte efeito. E é por isso que quando as demandas desses movimentos sociais chegam aos parlamentos nada ocorre, no círculo de decisões políticas já existe uma inércia e as limitações herdadas do passado.
Pense nisso, o sistema capitalista, no auge da sua produtividade, é incapaz de satisfazer plenamente as necessidades da população mundial por comida. É calculado que em 20 anos ou menos o preço dos alimentos será absurdamente mais caro do que é hoje. Atualmente ainda existem revoltas promovidas por populações famintas. Nada poderia atestar mais graficamente a falência desse sistema. No Norte da África, essas pessoas que se rebelaram recentemente gastam em média 80% da sua renda apenas para assegurar comida. Com o aumento do preço dos alimentos, como eles vão ficar? E, com esse aumento, algumas pessoas, que se dizem especialistas, já começaram a culpar os chineses e indianos pela alta dos preços. Com o fortalecimento das suas economias, eles começaram a comer. Que ultraje! Populações inteiras que sempre trabalharam como escravos, em jornadas de até 14 horas ao dia, começaram a comer como gostariam? Isso não é um absurdo? E é com desculpas como essa que nossa sociedade se acomodou para afrontar seus problemas. Eu insisto, fechando os olhos e varrendo tudo para baixo do carpete.
O grande dinamismo por trás do sistema capitalista ocorreu no momento em que o valor de troca substituiu o valor de uso. O uso primário de um produto capitalista é a venda, uma vez que você tenha vendido o seu produto, ele cumpriu com o seu objetivo. Não importa para onde ele vá, não importa se ele será utilizado uma, duas ou dez vezes. Isso é totalmente irrelevante.
O sistema capitalista, que possui essa dinâmica, atingiu o limite de suas contradições. O principal ponto do capitalismo é ignorar a necessidade real das pessoas. Prova disso é que ainda hoje as pessoas sofrem enormemente. Elementos da necessidade humana não podem ser considerados porque a natureza do nosso sistema é um crescimento sem limites e sem fim. E nesse sentido o céu é o limite. Não é bem assim. Dizer isso é enganar-se a si mesmo. Existe um limite para os seres humanos e a maneira como nos relacionamos com a natureza. Nossa existência depende da manutenção de uma relação aceitável com a natureza.
A crise econômica mundial
Engana-se quem acha que esse excedente chinês salvará o sistema, porque são três trilhões de dólares em comparação a 30 trilhões do restante do mundo. Não significa nada.”
A crise não caiu do céu, ela foi gerada. Quais são as razões dessa crise? A dívida dos Estados Unidos é hoje algo em torno de 14 trilhões de dólares. E essa é uma das dimensões que foi varrida para debaixo do carpete, 14 trilhões da dívida norte-americana varridos para debaixo do tapete. E ela cresce cada vez mais. Agora eu pergunto, por quanto tempo isso pode seguir adiante? Nos EUA, no último mês, o desemprego aumentou depois que trilhões de dólares foram injetados na economia.
O presidente Obama disse certa vez que já podia ver a luz no final do túnel da crise. Eu concordo com ele, também vejo uma luz. Mas é a luz de um trem vindo em nossa direção. Na ocasião, ele disse que o déficit dos EUA seria reduzido pela metade, e eu afirmei que era mais provável que o déficit dobrasse, exatamente o que aconteceu. Agora o Congresso norte-americano é incapaz de estender o próprio limite do endividamento do país. E essa conjuntura é global, está conectada com todos os outros países. Não é um problema da Espanha, ou dos Estados Unidos, ou de Portugal. Pegue a Itália como exemplo, onde um palhaço criminoso governa o país, Silvio Berlusconi.
Eu prefiro chamá-lo de Berlusconi, que é especialista em inventar soluções artificiais e provisórias para os problemas da economia italiana. Ele sofreu importantes perdas eleitorais nos pleitos municipais, mas eu ainda insisto, o que mudará com essas eleições? Muito pouco. Na Grécia, por exemplo, um governo de centro-direita foi substituído pelo Partido Social-Democrata. A única coisa que mudou foi a revelação de uma dívida catastrófica que causou um pedido de resgate de 100 bilhões de dólares para uma economia relativamente pequena. E, para piorar, eles precisam de um novo resgate. Por quanto tempo isso continuará a sufocar o sistema?
Os países encontraram um termo muito bonito para se referir a esse constante endividamento, “endividamento soberano”. Soberano é uma palavra que parece boa, mas estamos falando de algo em torno de 30 trilhões de dólares, que está aumentando inexoravelmente. Os economistas dizem que o único país que não enfrenta isso é a China, que está sentada em um excedente de três trilhões de dólares. Mesmo assim, engana-se quem acha que esse excedente chinês salvará o sistema, porque são três trilhões de dólares em comparação a 30 trilhões do restante do mundo. Não significa nada.
Agora, nenhuma das soluções para a crise virá do liberalismo. Os próprios limites do capitalismo precisam ser considerados, essa necessidade intempestiva por crescimento ilimitado. Isso significa exaurir nossos recursos estratégico-naturais. A própria questão da água, há muitas regiões no globo que a água não é mais apropriada para a produção e para o próprio consumo. Mesmo diante da exaustão gradual dos nossos recursos naturais, um imenso perigo, nós continuamos caminhando para a mesma direção do crescimento incontrolável. A própria solução para a crise financeira é crescer e crescer até superá-la.
As possíveis soluções para essa contradição assumem um caráter caricato. Karl Marx usou uma expressão interessante: “primeiro temos a tragédia, que depois transformamos numa farsa”. Isso se aplica ao capitalismo hoje, porque os especialistas dizem que nós vamos resolver os problemas da nossa relação com a natureza simplesmente reduzindo os níveis de emissão de carbono. Então é assim que vamos resolver o problema catastrófico do meio ambiente? Existe um limite para absolutamente tudo. É uma farsa porque todos os países, embora admitam que existe um grave problema a ser resolvido, continua a consumir energia irresponsavelmente. A população dos Estados Unidos representa 4% do total mundial e consome 20% dos recursos, um absurdo. Essa “solução fácil” é uma farsa, porque a não ser que a humanidade enfrente esse problema de maneira contundente – e aceite as consequências dessa escolha – nós nos encontraremos em um cenário devastador.
Programas de distribuição de renda e classe média ressentida
Talvez os críticos não sejam conscientes o suficiente sobre como a estrutura social é dolorosa para os mais pobres. O sofrimento é geralmente parte de um sistema imposto. A conscientização leva as pessoas a se perguntarem como resolver problemas como a fome. É com repressão?”
Todos esses programas estão ajudando as pessoas que vivem na miséria a saírem dessa situação. Isso é positivo e necessário, mas, sozinhos, não vão resolver os problemas. O Brasil não está imune aos problemas estruturais dos quais falamos. Sempre que programas como esses são criados, a classe média e alta tende a ficar enciumada e ressentida porque acham que estão apenas gastando dinheiro com a população mais pobre. Eu ouvia isso de um jeito muito intenso sobre as reformas promovidas pelo presidente Hugo Chávez, da Venezuela. “Vejam só como estamos gastando com isso”, diziam. Mas vejamos por outro lado: houve uma enchente colossal na Venezuela no ano passado e Chávez mandou os governadores com salas vazias nos prédios oficiais a abrigar pessoas que tinham sido afetadas pelos desastres. Isso é temporário, não resolve os problemas.
Então fizeram um programa para construir 200 mil casas para as pessoas atingidas. E as pessoas diziam: “É uma injustiça ter que ajudar essas pessoas”. Mas o oposto também é verdadeiro, porque muitos dos que reclamavam tinham recebido todo tipo de ajuda e facilidades durante a crise econômica. Agora, quando pensamos nos trilhões de dólares usados para salvar os bancos, quem recebeu esse dinheiro? Não foram essas pessoas que recebem benefícios do governo para sobreviver. Eles talvez tenham alguns milhares de dólares se acumularem por anos. Mas os bancos, as corporações, as grandes empresas receberam trilhões.
Quem salvou a General Motors? O governo dos Estados Unidos. Isso com Bush e com Obama. Colocaram trilhões de dólares em corporações corruptas e irresponsáveis.
Na Inglaterra, logo depois da Segunda Guerra, o governo trabalhista promoveu uma grande nacionalização e muitas pessoas viram aquilo como medidas socialistas. Mas o que eles nacionalizaram?
Todas as áreas falidas da economia. Eletricidade, minas de carvão, empresas de aço, e tudo mais. Todos os setores da economia capitalista que, sem essas medidas, não seriam salvas nem funcionariam. E ninguém fez rejeições. Diziam que eram ações para a garantia da economia.
E agora, recentemente, lemos nas manchetes de jornais as frases “salvando o sistema”, quando se referiam as medidas anti-crise adotadas. As pessoas realmente acreditam que não estão dando dinheiro para essas empresas, mas salvando o sistema. É aí que está o problema. Como você salva um sistema cavando mais buracos? Para fechar um buraco, você constrói outro maior e maior.
Tempos atrás, a Venezuela viveu uma rebelião que ficou conhecida como “Caracazo” (1989). Esse movimento aconteceu quando uma multidão de pessoas foi até a cidade de Caracas protestar contra as políticas econômicas do governo anterior. E o governo mandou suas tropas às ruas e assassinou pelo menos três mil pessoas. Chávez é o resultado das ações contra esse tipo de governo. O mesmo aconteceu durante a Comuna de Paris.
Então, sempre que alguém faz algo em benefício da população, como construir 200 mil casas para desabrigados, é acusado de gastar dinheiro.
Não acho que no Brasil alguém deva levar a sério as críticas aos programas sociais. Talvez os críticos não estão sendo conscientes o suficiente sobre como a estrutura social é dolorosa para os mais pobres. O sofrimento é geralmente parte de um sistema imposto.
A conscientização leva as pessoas a se perguntarem como resolver problemas como a fome. É com repressão? No “Caracazo” houve uma resposta militar. Isso hoje mudou. Não estou dizendo que não haja mais violência no mundo, mas isso hoje é algo inaceitável. No Egito, muitas pessoas foram reprimidas. Mas chegou uma hora que Mubarak, mandante da repressão, viu todos se voltarem contra ele, porque para fazer aquelas pessoas voltarem para casa seria necessário mandar matar todo mundo.
Ao mesmo tempo, ainda existem forças militares que defendem as políticas de ocupação de partes do mundo. E existem até teóricos militares nos Estados Unidos que dizem que não é mais possível para as tropas americanas saírem do Iraque nem do Afeganistão, onde a guerra dura quase dez anos.
A solução seria fazer com que os 40 mil combatentes fiquem por lá. Outros recomendam o uso de armas nucleares no Irã. Olha o grau da irracionalidade! Enquanto isso, os Estados Unidos têm uma dívida colossal. E estão cobrindo esses déficits tomando mais dinheiro emprestado. Outra dimensão do problema é que todo cidadão americano está endividado. Uma hora ou outra vai acontecer com os Estados Unidos o que acontece na Espanha, na Irlanda, em Portugal, na Grécia.
A Espanha está virtualmente falida, a Itália também. A Inglaterra também. E o que eles estão tentando fazer é justificar os altos a custos que estão submetendo as pessoas, cortando serviços de saúde e educação. Por trás de tudo isso estão as pressões históricas de um sistema anacrônico.
As pessoas ainda criticam os gastos com as pessoas que mais precisam. Depois da Segunda Guerra, surgiu a ideia do Estado de Bem Estar Social, que agora está sendo destruída. A ideia era que os ricos pagassem mais tributos, e a renda fosse distribuída. Agora, o que está acontecendo é o contrário. Nas regiões ricas, o que vemos é a isenção de taxas.
No Brasil a elevação do salário mínimo, por exemplo, foi uma iniciativa importante. Mas é um pequeno passo. Isso não vai mudar as estruturas econômicas que o Brasil terá que enfrentar, como qualquer país do mundo.
A onda conservadora europeia
“O que são esses partidos da social-democracia hoje na Europa? São herdeiros de anos de reformas que os trouxeram cada vez mais para a direita. O que aconteceu com as legendas mais radicais, como o Partido Comunista Italiano, de Gramsci? Suas propostas fundamentais foram completamente diluídas”
Essa é a questão central. Todas as nossas instituições políticas atuais são frutos de um processo histórico. E o horizonte das soluções que podemos adotar por meio dessas instituições está condicionada a esse processo histórico. Os parlamentos dos países que tentam enfrentar essas questões também têm atuação limitada. As pessoas pensam que podem virar as costas para a história. Isso não é possível. Para qualquer compreensão da realidade, é preciso ter uma perspectiva histórica. O que são esses partidos da social-democracia hoje na Europa? São herdeiros de anos de reformas que os trouxeram cada vez mais para a direita.
O que aconteceu com as legendas mais radicais, como o Partido Comunista Italiano, de Gramsci? Suas propostas fundamentais foram completamente diluídas e o PCI se fragmentou. Os verdadeiros partidos de esquerda hoje na Europa são muito pequenos, sem representação. Outro exemplo: na Alemanha, antes da Primeira Guerra Mundial, a esquerda defendia que chegaríamos ao socialismo por meio de pequenos avanços sociais, sem realizar grandes mudanças estruturais. Mas, durante a Guerra, os social-democratas aliaram-se entusiasticamente ao governo imperial.
O que veio depois não foi um lindo governo a promover pequenos avanços rumo ao socialismo, mas sim o surgimento de Hitler e um cenário muito mais catastrófico. As propostas dessas legendas de esquerda foram diluídas historicamente. O próprio partido dito socialista espanhol foi o responsável por adotar, diante da crise de 2008, medidas que puniram os trabalhadores.
As revoltas do mundo árabe
“Autoridades inglesas declararam que a saída do ditador do Iêmen seria muito perigosa porque poderia significar o controle do país pela Al Qaeda e, portanto, um risco à segurança na Inglaterra. Dá para imaginar isso?”
Esses movimentos estão surgindo lentamente. As pessoas estão começando a ficar extremamente desencantadas com a realidade da situação. No mundo Árabe, as revoltas aconteceram porque a situação simplesmente explodiu.
Em alguns casos, os ditadores foram depostos, mas quem atuava por trás deles? Nós falamos de democracia na imprensa ocidental, mas aqueles ditadores eram fantoches que atuavam na lógica norte-americana de governar o mundo. Por isso que eu digo que essa realidade é uma contradição imensa. No Iêmen, também há um ditador assassinando o seu povo, mas os Estados Unidos não quiseram dizer algumas palavras sobre democracia, eles não disseram que esse ditador deveria deixar o país e seu povo em paz. Simultaneamente, autoridades inglesas declararam que a saída do ditador do Iêmen seria muito perigosa porque poderia significar o controle do país pela Al Qaeda e, portanto, um risco à segurança na Inglaterra. Dá para imaginar isso? A Al Qaeda no Iêmen sendo um perigo para a segurança inglesa? É um absurdo e os políticos se atrevem a dizê-lo em público, mesmo que não acreditem sinceramente numa palavra.
Na Arábia Saudita, existe um regime brutal, praticamente feudal. Mas tudo bem, porque ela é uma aliada fiel das nossas democracias e liberdades. Esse tipo de contradição não pode seguir adiante.
E essas contradições causam a emergência de iniciativas diretas lideradas por pessoas sem ligações com partidos políticos. E isso é um dos sinais mais esperançosos. Há pouco tempo as reuniões políticas estavam repletas de pessoas mais velhas, e agora esses encontros estão repletos de pessoas mais novas.
As manifestações pela Europa
Nós criamos o hábito de varrer nossos problemas para debaixo do carpete. Só que o nosso carpete histórico se parece cada vez mais a uma montanha, está cada vez mais difícil de caminhar sobre ele. Não há solução imediata”
Em uma economia capitalista mais estruturada, como a Inglaterra, onde por anos a juventude foi extremamente alienada, houve uma verdadeira rebelião contra o apoio do Partido Liberal ao aumento das taxas para a educação superior. Os liberais opunham-se a esse aumento durante a campanha e a juventude inglesa realizou protestos massivos nas ruas e certamente os punirá nas futuras votações. E então vemos tanto o lado positivo quanto o negativo das nossas estruturas institucionais. O lado bom é que as pessoas revoltadas com a traição de um partido se manifestam e pressionam os partidos. Porém, o que mais podem fazer? Esperar anos pelo próximo pleito e colocar um pequeno pedaço de papel numa urna de votação. E o que um partido diferente pode trazer de novo? Muito pouco, quase nada. Uma vez eu citei a frase do escritor norte-americano Gore Vidal, sobre a situação política nos EUA. Ele afirmou que no seu país havia apenas um partido político com duas alas direitistas. Bem, na Inglaterra, na Itália e na Alemanha ocorre a mesma coisa. Não importa para onde você olhe as opções são limitadas porque a margem para a ação política é muito estreita.081211_meszaros
Eu não esperaria grandes mudanças imediatas nas manifestações na Europa. Os problemas do nosso sistema capitalista são tão grandes que levará um grande tempo para que qualquer movimento surta efeito. Mas eu acredito que veremos ainda algumas mudanças fundamentais. Não significa que acontecerá nos próximos dois ou três anos, porque nós criamos o hábito de varrer nossos problemas para debaixo do carpete.
Só que o nosso carpete histórico se parece cada vez mais a uma montanha, está cada vez mais difícil de caminhar sobre ele. Isso ocorreu porque, diante de um problema, temos essa necessidade de encontrar uma solução a curto prazo, para um período de dois ou três anos. Basta se lembrar de quantos milagres econômicos ouvimos falar. Eu me lembro o milagre alemão, o milagre japonês e até o milagre brasileiro. Todos evaporaram, porque milagres não resolvem os problemas da nossa sociedade.
Nossa sociedade deverá se confrontar com problemas estruturais e fundamentais, será uma grande mudança de uma ordem social para a outra. Tente projetar isso para o passado. Do sistema feudal para o sistema capitalista essa transformação levou séculos. Séculos de grandes crises. Imaginar que mudar de uma ordem social que foi dominante por três ou quatro séculos para outro pode levar apenas algumas décadas é ingenuidade.
América Latina, terra de esperança
“Eu também tenho ressalvas à expressão “capitalismo avançado”. Os países capitalistas avançados são os mais destrutivos. Você chamaria isso de avançado? Não é avançado e em muitos aspectos nos traz de volta à condição da barbárie”
Quando você pensa na totalidade da América Latina, é impossível negar que houve tremendos avanços políticos. Houve mudanças significativas também em outros aspectos. A primeira vez que eu vim ao Brasil foi em 1983. Após uma conferência em João Pessoa, eu dava uma entrevista numa rádio local quando vi pela janela uma grande aglomeração de pessoas. Durante a pausa para os comerciais, fiquei sabendo que a razão daquela movimentação toda era que em algum lugar perto de João Pessoa havia protestos de pessoas famintas, que não tinham o que comer.
O programa de Lula de combate à fome foi uma resposta a situações como a que eu vi. Hoje, pelo o que sei, não existem mais protestos por comida no Brasil. O aumento do salário mínimo também foi uma contribuição importante. E mudanças também ocorreram na Venezuela, Bolívia, Paraguai e Argentina. A Argentina, por exemplo, deveria ser um daqueles milagres econômicos. Mas o milagre argentino terminou na total falência do País. Eles chegaram até a dolarizar sua economia, abandonaram sua moeda e foram sufocados por isso. Os protestos populares levaram à mudanças significativas na Argentina. Então, a América Latina é um continente onde várias experiências interessantes ocorreram e ainda estão em curso.
Agora, eu não afirmo com isso que a América Latina, assim como o restante do mundo, poderá se isentar de enfrentar esses problemas estruturais que eu já mencionei. E esse é o grande desafio para o futuro. A dimensão muito positiva é que na América Latina existem movimentos extremamente importantes como ocampesinos e o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). São movimentos sociais que não tem a perspectiva de implorar por favores políticos, mas que tomam a iniciativa e tentam controlar as coisas por si mesmo. Uma das características mais importantes desses movimentos é que eles tentem controlar a situação.
Na América Latina, as soluções também precisam levar em conta um esforço para remediar nossa relação com a natureza. Em um futuro próximo, por exemplo, nós teremos de considerar como colocar energia nos nossos carros. Se você produz carros, eles precisam de energia de alguma maneira. Ao mesmo tempo, nós multiplicamos cada vez mais o número de carros porque a produção não pode parar. Mas, o que precisamos fazer é perceber que a real necessidade das pessoas é o transporte, não os carros. Nós precisamos pensar em meios de transportes adequados, não carros individuais que agridem a natureza.
Eu a considero a América Latina, de longe, o continente mais esperançoso do mundo. Aqui, coisas interessantes vêm acontecendo desde os anos 70. A primeira reação aos movimentos que eclodiam, naquela época, foram as ditaduras. Ao menor sinal de problema, os norte-americanos encontravam um ditador. Eles enviavam os fuzileiros ou achavam algum general que pudesse fazer o trabalho por eles. Hoje os Estados Unidos não podem mais fazer isso, essa fase histórica passou, mas ainda carrega consequências e repercussões.
Eu acredito que as reais transformações estruturais, que levaram séculos para acontecer do feudalismo para o capitalismo, não demorarão tanto para ocorrer. Por quê? Porque nós não temos séculos. Nosso tempo está se esgotando. E essas mudanças não podem ser pensadas como algo isolado ao “mundo subdesenvolvido”. Nós vivemos em um único mundo. Existem alguns conceitos mistificadores como “terceiro mundo”. Eu sempre rejeitei essa expressão. O que é o terceiro mundo? Eu apenas conheço um. Não é o “terceiro mundo”, mas uma parte integrada do mundo na qual os países são explorados. E a América Latina é o continente mais esperançoso onde as mudanças serão iniciadas, mas não poderão ser concluídas.
Globalização é um conceito utilizado apologeticamente. A realidade da globalização é que existe, na verdade, uma tendência para a integração econômica. Mas, politicamente, nada é resolvido. E hoje ainda prevalece a lógica de confrontar problemas políticos por meio da guerra, violência e destruição. É o que fazem os Estados Unidos. Isso é um grande absurdo porque nada na história da humanidade foi resolvido pela guerra.
Eu também tenho ressalvas à expressão “capitalismo avançado”. Os países capitalistas avançados são os mais destrutivos. Você chamaria isso de avançado? Não é avançado e em muitos aspectos nos traz de volta à condição da barbárie. Rosa Luxemburgo uma vez disse “socialismo ou barbárie”. Eu acrescentaria algo à frase de Rosa Luxemburgo: “barbárie, se tivermos sorte”. Porque a destruição total da humanidade é o que está em nosso horizonte. A tendência é sempre resolver os problemas com guerras e destruições. Na Primeira Guerra, os aliados saíram vitoriosos. Mas o que eles resolveram? Eles criaram Hitler. Por isso eu digo que as decisões estão sendo tomadas às costas das pessoas. Elas nunca antecipam as coisas. Elas nunca imaginam que depois da vitória vem a destruição.
Em 1871, na Comuna de Paris, o que aconteceu foi uma brutal destruição. Bismarck, o chanceler alemão, que venceu as tropas francesas anos antes, quando viu as comunas tomando o poder em Paris, ordenou a libertação dos prisioneiros de guerra franceses para destruir a organização. O que aconteceu depois? Três impérios fizeram um pacto para lutar juntos contra esses tipos de distúrbios feitos pela população, caso acontecesse de novo. Isso não é mais possível. Um dos maiores estrategistas de guerra de todos os tempos, general Carl Von Clausewitz, disse uma vez: “a guerra é a continuação da política, só que por outros meios”. Hoje isso é inconcebível. Uma nova guerra mundial acabaria com a humanidade. Essa é a diferença histórica fundamental.
A América Latina é hoje uma das regiões onde se tem mais esperanças, porque as pessoas estão tomando o controle das decisões, assumindo responsabilidades, depois de terem eliminado ditadores.
E como vamos fazer essa transformação? Transformando as pessoas. A exploração da esmagadora maioria das pessoas por poucos não é mais aceito como era antes. No socialismo você não pode fazer isso. Você não aceita uma minoria que controla a política e a economia tomando todas as decisões. Seria um absurdo. Por isso temos que criar uma sociedade da igualdade substancial. A produção de mercadorias e o mercado devem ser as bases dessa equalização. Precisamos ir em direção a um sistema de igualdade substancial, com reorientação, com participação nos processos de decisão, com nossas decisões sobre o que queremos fazer para tornar nossas realizações mais justas, mais igualitárias. Ninguém precisa decidir isso por você.
Em The Critique of The Gotha Program, Marx fez a definição do que seriam os estágios inicial e final do socialismo. No primeiro, a distribuição seria feita a cada um de acordo com a sua contribuição para o total do produto social. Na fase avançada, seria de acordo com a sua capacidade ou necessidade. Agora, quem determina o que a gente precisa? Apenas uma pessoa, você mesmo. Hoje, 1% ou 2% da população controla de 40% a 60% dos recursos e riquezas da sociedade. Para mudar isso, será preciso uma cooperação das pessoas pelo mundo. Para produzir e distribuir conforme as necessidades, será preciso criar empresas cooperativas. Isso vai ser a base da sociedade do futuro. E não podemos ter certeza de que essas transformações vão ser feitas apenas dentro da lei. Não estamos enfrentando apenas leis humanas, mas as leis da natureza. A natureza está nos impondo seus limites. Por isso precisamos nos adaptar ao melhor uso dos recursos. Isso vai acontecer em pouco tempo – mas não no meu tempo, infelizmente. As pessoas estão começando a confrontar essa realidade, sobretudo na América Latina.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Greenpeace faz protesto contra Código Florestal em Brasília

Brasília amanheceu hoje (6) com uma manifestação contra a aprovação do novo Código Florestal. Na Praça dos Três Poderes, representantes do Greenpeace inflaram um balão gigante em formato de motosserra, que trazia as frases: “Senado, Desliga Essa Motosserra”, de um lado, e "Dilma, Desliga Essa Motosserra", de outro.


Para o Greenpeace, a aprovação do projeto do novo Código Florestal compromete as metas do país de preservação do meio ambiente. “O projeto de lei como está [escrito] vai levar ao aumento do desmatamento, [conceder] anistia para quem desmatou ilegalmente e ainda abrir brechas para novas concessões”, disse a engenheira agrônoma do Greenpeace Brasil Tatiana de Carvalho.


De acordo com ela, o texto em discussão no Congresso sobre o Código Florestal causa prejuízos para a sociedade, pois ameaça a segurança dos rios e do mar, além de pôr em risco as florestas do país.


“A gente já vê uma série de catástrofes naturais acontecendo de forma cada vez mais frequente. Esse [texto sobre o novo] Código Florestal não trata somente de questões rurais, mas também de questões urbanas, como a proteção de encostas”, disse ela.


A previsão é que o Senado, no plenário, vote ainda hoje (6) o texto do novo Código Florestal. Até ontem (5), segundo assessores, foram protocoladas 44 emendas. Nos debates que ocorrerão ao longo do dia, podem ser incluídas mais propostas.

Desigualdade entre populações ricas e pobres atinge níveis recorde, também na Europa

A desigualdade entre ricos e pobres no seio dos países que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) aumentou até atingir seu nível mais alto em 30 anos, de acordo com um relatório elaborado pela mencionada instituição internacional no que o Estado espanhol e estados considerados tradicionalmente mais igualitários, como a Alemanha, Dinamarca e Suécia, incrementaram a fenda, devido a uma maior fratura do mercado trabalhista.

O relatório "Seguimos divididos: Por que a desigualdade segue aumentando?" conclui que os rendimentos médios do 10% rico é atualmente nove vezes maior que a de 10% mais pobre de toda a OCDE. No caso do Estado espanhol, esta distância multiplica-se por onze vezes.
A desigualdade aumentou inclusive em países que se identificaram por ser iguais, como a Alemanha, Dinamarca e Suécia, de 5 a 1 na década de 1980 e de 6 a 1 hoje.
A fenda é de 10 a 1 na Itália, Japão, Coréia e o Reino Unido, e mais de 14 a 1 em Israel, Turquia e Estados Unidos.
Entranto, no Chile e México os rendimentos dos mais ricos continuam sendo mais de 25 vezes superiores aos de quem vive em condições de pobreza, as cifras mais altas da OCDE.
Assim mesmo, a diferença de rendimentos é muito maior em grandes economias emergentes fora da OCDE. A margem 50 a 1 encontra-se no Brasil, que se mantém com uma desigualdade muito superior à de muitos outros países, apesar de que tem descido de maneira significativa durante a última década.
"O contrato social está começando a ruir em muitos países. Este estudo desacredita a hipótese de que os lucros do crescimento econômico automaticamente repercutam sobre os mais desfavorecidos", assinalou o secretário geral da OCDE, Angel Gurría, durante a apresentação do documento em Paris.
"Sem uma estratégia integral para o crescimento, a desigualdade seguirá aumentando", sustentou.
No caso pontual do Estado espanhol, a Organização indicou que "a desigualdade diminuiu desde meados dos anos 80, contrariamente ao acontecido na maioria dos países da OCDE, onde houve uma tendência importante à alta nos últimos 25 anos (...) No entanto, dados nacionais recentes mostram que a desigualdade tem incrementado nos dois últimos anos".
Igualmente, a instituição apreciou uma menor diferença de salários entre os trabalhadores melhor e pior remunerados. Assinalou que a diferença diminuiu no Estado espanhol em 20% entre 1994 e 2008. Neste mesmo período, incrementou-se praticamente em todo o resto dos estados da OCDE.
Os sistemas fiscais desempenham um papel importante na redução da fenda da desigualdade impulsionada pelo mercado; no entanto, caiu sua eficácia na redistribuição dos rendimentos desde a metade da década de 90.
Agora sabe-se que o condicionante principal na redistribuição dos rendimentos se encontra no lado dos lucros. Os níveis de lucros reduziram-se em quase todos os países da OCDE e não pôde ser mantido o ritmo de crescimento dos rendimentos.
Outro ponto significativo foi o corte nas taxas impositivas dos rendimentos mais altos.
"Nosso relatório indica claramente que a melhoria das qualificações da mão-de-obra é de longe o instrumento mais poderoso para contrarrestar a crescente desigualdade de rendimentos. O investimento em capital humano deve começar na infância e continuar através da educação e o trabalho", assegurou o secretário geral da OCDE.
A mencionada organização ressalta a importância na necessidade de que os governos revisem seus sistemas fiscais para assegurarem que as pessoas mais ricas contribuem com uma quota justa para a carga fiscal.
A proposta pode ser atingida incrementado as taxas marginais de impostos aos ricos e na melhoria no cumprimento das obrigações tributárias. Além disso, eliminando as deduções fiscais e reavaliando o papel dos impostos em todas as formas de propriedade e riqueza.